sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Branca de Neve Vai Colocar o Salvador no Pau

Branca de Neve, a patroa de Cinderela, aproveitou todas no carnaval de Salvador com os sete anões. Cada um lhe deu uma droga: Mestre lhe deu maconha, Feliz, um êxtase, Atchim, cocaína, Dunga lhe deu um quartinho de LSD, Soneca, um prato de brigadeiros, Zangado a regou com café e energéticos, Dengoso finalizou com uma MDMA. Foi quando a autointitulada Rainha Má do Axé (poderosa e linda, má só na ficção) passa entoando “e diga yes, diga yes…” oferecendo a Branca de Neve a cerveja oficial do carnaval. Hipnotizada pelo “porque sim”, Branca de Neve dá um grito cantarolando “… sou negão!”, toma uma lata da cerveja e cai desfalecida com a overdose, sendo carregada para o posto de saúde da Prefeitura no Morro do Gato. Eis que naquele momento aparece o Prefeito, ops, Príncipe, com sua equipe para fiscalizar os trabalhos e postar nas redes sociais a foto tirada por sua assessoria de comunicação. Com uma sandália gladiadora de salto fino na mão, ao ver a estonteante Branca de Neve desacordada, experimenta nela a sandalinha com ponta de cristal. Tomado por uma alegria incontrolável por tê-la encaixado perfeitamente e achado sua princesa, beija apaixonadamente Branca de Neve, acordando-a de seu sono profundo. Ainda embriagada pela bebida envenenada, Branca de Neve acorda subitamente e, sem nem olhar para a cara do Príncipe, vomita do outro lado todo aquele brigadeiro misturado à cerveja. Horrorizado, o Príncipe sai desapontado com o fim de sua fantasia. Branca de Neve nem se dá conta de sua presença. Aos sete anões, prometeu processar o Município do Salvador por ter cedido ao patrocínio de cerveja de gosto tão ruim. “Vô botá o Prefeito no Pau”, esbravejou a princesa, mesmo tendo adorado a folia bem organizada nesse ano. É isso: acabou-se o carnaval.
Agora, é gente ruim de um lado dizendo: “Vô botá na jiusticia, vum!”, “Cê vai se vê cum delegado!”, “Cê sabe o que é xadrez?”. Do outro, uma pessoa boa se inquieta: terá que contratar um dos milhares de advogados para responder desnecessariamente a um processo, no meio de tantos afazeres. Ou então, gente boa não consegue resolver uma situação com um(a) malandro(a), entra contrariado(a) com processo porque não pode fazer justiça pelas próprias mãos e ainda ouve um debochado “vá, pode ir, vá lá!”, porque gente ruim sabe que processo no Brasil geralmente demora horrores. Se só por pensão alimentícia quem tem dívida é preso, então pode sair dando golpe e continuar sem ter onde cair morto(a), já que nesse país, vagabundo(a) estelionatário(a) não precisa nem de delação premiada: é só ser um “zero à esquerda” que sai do processo com a cara mais lisa do que entrou.
Quem paga pela brincadeira? Todos os contribuintes, eu, você que está lendo. A começar pelo entupimento de processos, levando a uma lentidão generalizada, e aí quem tem algo sério para resolver demora anos nessa “injustiça institucionalizada”, como dizia Rui Barbosa. Enquanto isso, uns utilizam a máquina estatal para pirraçar ex-amores, outros usam a lentidão da injustiça para se eximir de responsabilidades. Há ainda aqueles que não têm o que fazer e correm para Delegacia ou Defensoria Pública criando histórias a fim de espezinhar vizinhos ou ex-contratantes tentando angariar indenizações, pois em tempo de crise quem não tem criatividade ou força produtiva acha que uma indenizaçãozinha por dano moral por qualquer bobagem até que cairia bem. Não têm nada a perder, arriscam para ver se lucram alguma coisa. E aí vem o tempo de Conselho Tutelar, Polícia Civil (Policiais e Delegados), Defensoria Pública, Ministério Público, Judiciário (Juízes, Oficiais de Justiça, toda a equipe de cartório), todos para resolver a falta de boa fé de um povinho do povo brasileiro. Porque ô povo cheio de gentinha que não vale nada!
E essa epidemia independe do poder econômico. Uma servidora pública formada em Direito e excelentemente bem remunerada entrou no Juizado Especial porque o camarote da festa de São João não tinha a marca da vodca que foi anunciada. Ganhou indenização, porque o juiz julgou procedente (possivelmente frequentador do mesmo tipo de camarote. Tá, em tese foi violado um direito do consumidor, mas, e o dano?). Um senhor desempregado, por intermédio da Defensoria Pública e com gratuidade judiciária, processou uma fábrica de pão porque comprou no supermercado um que já estava mofado antes do prazo. Ele nem o comeu, nem passou mal, nem nada. Ganhou indenização, porque a outra parte viu que era mais barato pagar alguma coisa num acordo e se livrar do processo do que continuar pagando advogado. As pessoas estão vencendo as outras pelo cansaço. Aquele negócio de dialética virou coisa de grego mesmo.
Existe um direito constitucional que precisa ser mitigado com urgência e ninguém parece dar bola: a ASSISTÊNCIA JURÍDICA GRATUITA. O pobre corre primeiro para a Delegacia, enche de abobrinhas os ouvidos do Delegado e abarrota de crimes de “ameaça” e “calúnia” as páginas dos inquéritos. Depois vai na Defensoria Pública, consegue ser acompanhado gratuitamente pela instituição, move toda a máquina judiciária, também gratuitamente, supostamente para resolver um problema e ao final perde a ação porque fica constatado que era tudo invenção da parte. Qual a penalidade? Nenhuma, é seu direito fundamental constitucional a levar ao Judiciário sua querela, responderão uns. Só se a outra parte não tiver o que fazer representa o(a) mentiroso(a) por denunciação caluniosa, mas eu nunca, nunca vi ninguém fazer isso. Entrar com ação regressiva de danos morais ou pedir condenação por litigância de má-fé também, ao final, possivelmente seria mais perda de tempo para quem foi processado, pois quem não tem com o que pagar não paga condenação por dívida contratual, que dirá indenização! Quem paga por essa Disneylândia de vagabundo (a)? Toda a sociedade, com os salários dos servidores, com o aparato estatal, com a ausência de celeridade judicial pelo engarrafamento de processos. Afinal, depois do carnaval, a epidemia agora é “botar no pau”. “E tome, tome, tome, tome, tome…”.

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